sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Falta de tempo




Nunca temos tempo. Para ser e até para não ser. Para arrumar ou desarrumar. Decidi organizar a biblioteca e baixei todos os livros da estante. Um assalto, os livros no solo com pavor de minha reação. Foi um surto de um dia, mas que demandaria um mês inteiro para terminar. Quem disse que levei adiante? Os livros continuam deitados. O assalto virou sequestro. Deixei a ânsia de corrigir minha vida e ordenar alfabeticamente os autores para outro momento.

Nunca temos tempo. Para trabalhar ou rever amigos ou descansar e desfrutar as distrações. O tempo de férias não conta, é um templo planejado, que mais se assemelha a um trabalho free lancer do que a uma espontânea inquietação. Passagens, hotel ou casa alugada, pagar as contas com antecedência, procurar alguém para controlar a casa, manter a água das plantas, isso que não possuo cachorro...

Não temos tempo a perder, muito menos a ganhar. Tempo é espaço, estar perto para conseguir voltar. Não tenho tempo para responder mensagens, não tenho tempo para ir à praça. Diversão termina rápido. Minha boca é um relógio de corda.

Meu tempo transformou-se curiosamente na minha falta de tempo. Sempre me desculpando, sempre alegando algum outro compromisso. Ainda mais para quem não aprendeu a dizer não. Eu desmarco, não nego nada. O constrangimento de cancelar algo me transtorna. Fico dias sem dormir aventando perdões absurdos. Qualquer contemporâneo tem vidas paralelas. E mortes paralelas também.

Existe um único antídoto para a falta de tempo. Um único. Estar apaixonado. Esquecer de si para inventar o desejo. O desejo transforma-se no próprio tempo. Tudo é adiado. A dispersão nos leva a reparar nas janelas, nos interruptores, nos sapatos dos colegas. As córneas se abaixam. Nada mais tem tanto significado do que se aprontar, ensaiar e aguardar perfumado o encontro. Passar as roupas é uma necessidade. Os vincos são desafiados com inusitada paciência. Depilamos a agenda. Compromissos sérios pulam de casas e horários. Antes imutáveis, as reuniões trocam de vôo de modo nervoso. O trabalho passa violentamente rápido. Não há o medo de ser demitido, o medo de se proteger, o medo de repetir as relações passadas, a segurança de prever. Cada um assume uma condição noturna, intermitente, o olhar abobado e a vontade excessiva. A imaginação pára a escrita em um só nome.

Aconselho a quem não tem tempo: apaixone-se. Perca a cabeça na guilhotina. Entregue seus pés para a espuma. Permita a cintura subir como um chafariz. Não pense que vai dar errado. O que pode dar errado já aconteceu antes. Dentro do tempo.
Fabrício Carpinejar

Franqueza para machucar





Os casais terminam se odiando porque eles se reduzem. Eles se apequenam e não reparam na dispersão destrutiva. Se no começo ambos enxergam apenas o lado bom e se apaixonam; com a convivência, tomam gosto pela agressão gratuita. Não que o lado bom tenha desaparecido, é que não tem mais graça.
Com o pretexto da franqueza, preparam o veneno. Há uma esperança enganosa de que o pedido de desculpas apaga a grosseira, que a compreensão abole a ofensa, que a cumplicidade é maior do que as adversidades. 
Não fazem por mal, mas fazem. Espancam o primeiro que aparece pela frente. O primeiro que aparece é sempre um ou o outro. Afinal, são os únicos que estão em casa. 
Como se conhecem perfeitamente, os dois passam a listar os defeitos numa discussão ou numa tola conversa. Como se os defeitos dependessem de reprise. 
Ele dá uma opinião sobre o casamento e ela o desqualifica, avisando que ele não tem base moral na família para dizer isso. E mexe os galhos podres sobre sua cabeça. 
Ela chega com mechas no cabelo e ele lembra que é a terceira vez em duas semanas que ela volta do salão com um novo corte. 
Ele põe uma camisa listrada todo feliz e ela pergunta se ele sairá desse modo ridículo. 
Ela está nervosa com as contas do cartão e ele vem com um sermão de que gasta o desnecessário, sendo que parte do superficial são o sorvete e as frescuras que ele pede no mercado. 
Ambos estão jantando com amigos e a mulher confessa que é impraticável dormir com os roncos dele. O marido, sexy e solto até o momento, quase morre de apnéia com o drinque. 
Ela narra sua adolescência e os lugares que freqüentou e o cara consegue ficar com ciúme dos fantasmas e perguntar pormenores. 
Ele recebe um elogio de uma mulher e ela, de pronto, chama a menina, que nem conhece, de piranha e interesseira. 
Ela estaciona o carro numa brecha impossível. Ao invés de elogiar, ele declara que é o mínimo que se pode fazer depois de 45 horas de auto-escola. 
Ele se sente um pouco mais musculoso, ela logo encontra com as mãos: 
- Ainda tem uma barriguinha. 
Ela compra lingerie e se assanha de perfume, ele confessa que teve um dia cheio. Um dia cheio que não apaga a televisão. 
Ele tenta dançar, depois de inúmeras reclamações de que não se mexe em festas. 
- O que você achou?, pergunta, eufórico, depois da balada. 
- Melhor ficar parado, ela diz, categórica. 
A mulher percebeu que ele se soltou exclusivamente nas músicas gays. Os braços histéricos e as pernas duras. 
Ela é convidada para uma festa dos colegas e ele transforma sua ida em favor e sacrifício. Claro que ela não se diverte, termina entretendo o marido que não deseja se enturmar. 
Os casais não necessitam se bajular, mentir, simular quando não se tem vontade. Mas é masoquismo não deixar que o desejo se torne memória, reprovar de modo permanente quem amamos, rebaixar quem depende de uma delicadeza. Ninguém ajudará sua companhia falando a verdade, mas sendo a verdade. 
Intimidade é gentileza. 
Fabrício Carpinejar

Quando não se espera



Você está cansada, peças mistas, roupa de terça-feira, a língua não pousa sábia, teve irritações no trabalho, não arrumou as unhas, andou pra cima e pra baixo com as botas, é o dia perfeito para não encontrar nenhum amor. Para descansar e ficar em casa, comendo chocolate e assistindo capítulos perdidos do seriado preferido.

Mas ele surge sem ser convidado. Ele aparece como para contrariar. É um amigo que não prometia atração, um colega que não demonstrava interesse, um conhecido que abre a guarda.

Ontem estava disposta, ontem estava perfumada e irretocável, ontem estava com chapinha e decote, ontem desejava que acontecesse. Hoje se sente um bagulho, acima do peso, acima da idade (se é jovem ou velha dependendo do humor), e ele se oferece, cheio de intenções e malícia, soprando palavras misteriosas, que confundem e a tiram para dançar.

Como explicar que não está depilada? Muitas amigas desistem do compromisso para manter a reputação das virilhas. O homem vai deduzir que ela não está a fim enquanto a razão é outra.

A verdade é essa: ele a convida para sair logo hoje. De repente, não haverá um segundo convite. Aceita contrariada, querendo retornar cedo. Não consegue se desvencilhar e enfrenta a decisão de ir até o fim ou deixar para depois. Arruma dezenas de desculpas infundadas, despropositadas, esfarrapadas como a lingerie que tenta esconder, que precisa terminar um projeto ou que tem reunião de manhãzinha.

Toda mulher teme perder o homem porque não está produzida e preparada. Mas o que o homem mais gosta é de uma mulher desprevenida. Uma mulher que supera os condicionamentos da beleza para se inventar. Uma mulher que surpreenda sua indisposição com a vontade da voz. Uma mulher com cara de quem se acorda, não com cara de quem vai dormir. Uma mulher que não aguarda o melhor momento, mas deixa que aquele momento, tão ínfimo e opaco, despretensioso e discreto, encontrar sua grandeza. É quando ela se dá conta de que terá que tomar banho mesmo nos lábios dele. É quando ela se dá conta de que terá que esticar as pernas para apertá-lo dentro.

Despreparados para o amor, o amor é sincero. Ao invés da sedução partir de frases escolhidas, escolhe qualquer cisco para o ninho e o ensina a voar. Uma gafe, um tropeço, um arrependimento não prejudicam a conversa, o que existe é cumplicidade, que pede água para manter a naturalidade da boca. Vocês não estão bêbados, vocês não estão irresponsáveis, vocês não enlouqueceram, nenhum motivo para esquecer, e a noite se molda aos seios como uma segunda pele.

A noite perfeita não é a noite prometida, com a expectativa de brilhar, a noite perfeita é a que não se espera.
Fabrício Carpinejar

Um amor sem volta




Meu primeiro beijo na boca me deu uma lição.
Uma lição que guardo até amanhã.
Apaixonado pela colega Alice. Ambos com treze anos. Cursávamos o último ano do Ensino Fundamental.
Ela não gostava de mim, gostava como amigo. Mas meu amor por ela valia por dois. Amava por mim e por ela. Amar em dobro é dobrar também a própria solidão.
Durante dois anos, guardei o sentimento sufocado. Escrevia cartas e poemas. Redigia bilhetes curiosos e ternos durante a aula. Anotava corações em seus cadernos. Insinuava uma aproximação atrapalhada, apressada. Agüentei no osso seus namoros com caras mais velhos, as confidências e detalhes macabros de suas conquistas.
Uma noite chuvosa, correndo de mãos dadas para chegar em casa, tentei o beijo, emparedei sua cintura debaixo da marquise e ela escapou o rosto. Meu primeiro beijo foi um não-beijo. A chuva me impediu de chorar.
A partir desse encontro, nossa amizade não poderia seguir ingênua. Não poderia nem seguir. Ela me olhava desconfiada. Sempre que uma mulher olha desconfiada nos promove a homem. Não posso esconder o orgulho de ser observado como homem após permanente insistência. Mesmo que seja como homem recusado.
O que não esperava é que ela abrisse a guarda, orientada pelo irmão, que aconselhou:
- Dá uma chance para o menino.
Mandou um bilhete avisando que não viveria sem mim. Convidou-me para ir ao seu apartamento. Seus pais estavam no cinema.
Eu a beijei no sofá. Era mais alta do que eu. Errei um pouco a altura do tronco para encaixar. Um beijo tímido, sem convicção. Um beijo com a língua hesitante. Com os lábios mudos, murchos.
Logo nos despedimos. E fingíamos que nada acontecera. Prometemos ligar no dia seguinte, não mais nos falamos. Nem para acarrear o amor. Mudei meu lugar na classe e sentei ao fundo. Seus cabelos loiros me acenaram longamente.
Eu a amava, mas não fora suficiente. Ela deve ter pensado que ficar comigo era o melhor. Mas o melhor não é o verdadeiro. Não se persuade o corpo com argumentos. Ela desejava me amar por admiração ao amor que eu sentia duplicado. O amor que a tornava Alice do Fabrício. Ela tinha ciúme do próprio amor que nutria por ela e queria tomar de volta.
Meu primeiro beijo na boca me deu uma lição.
Uma lição que guardo até amanhã.
Que o amor não se convence.

Fabrício Carpinejar

todo o andamento das coisas, o vai-e-vem das horas, dos dias, dos meses, as estações do ano, a luz do sol mudando de posição, todos os acontecimentos imperceptíveis, que vão se modificando aos poucos, fazendo mudar as coisas: tudo isso fala de tempos novos, de possibilidades animadoras, do quanto é necessário e imprescindível que os fatos se desenrolem e do quanto é complicado e maravilhoso viver.
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é preciso compreender.


também existem desesperanças, como não? nem tudo é alegre. há ainda alguma fadiga nas coisas da vida, o que é absolutamente normal. porque há muitos detalhes pra se levar em consideração e é mesmo um tanto complicado dar conta de tudo simultaneamente. cuidar dos dentes, tratar o estômago, ser criativo no trabalho, dormir 8 horas por noite, zelar pela reputação, abrir mão da preguiça, alimentar-se corretamente, pensar se está tudo bem com a família e os amigos, chorar escondido, rir publicamente, indignar-se com as canalhices, tentar não ser injusto, suportar as contrariedades com serenidade, saber falar e saber calar — enfim, são muitas as tarefas para que tudo esteja em ordem na vida e nem sempre é possível obter sucesso em todas elas. vai daí que é necessário compreender. embora nelson rodrigues tenha dito (mais ou menos assim) que o que estraga o mundo são os compreensivos, devo admitir, não sem algum desânimo, que é preciso, sim, engolir sapos, aceitar contrariedades, compreender. já estou um pouco cansado de compreender, mas, contraditoriamente, o meu estoque de compreensão é grande e não vou abandonar essa tarefa, porque senão a vida vira um desenredo. o legal de tudo é que o horário de verão começa semana que vem e é animador. com o sol (sol? em curitiba? ah, vá!) durando até mais tarde, a expectativa é que as desesperanças fiquem mais claras. e talvez até derretam!
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é tudo provisório.
o coração provisório pede amor que vai se acabar. os olhos provisórios enxergam as cenas impermanentes. na precariedade da vida, acumulam-se perguntas (estas, sim, infinitas) e andam sobre a corda bamba as respostas malabaristas (a qualquer instante podem desabar, modificando tudo). a terça-feira 06/12/2005, quando isto começou a ser escrito, também era provisória e se extinguiu — e, das coisas daquela hora, o que ficou consolidado? nada. pois é tudo provisório e nada se consolida. o sentido de tudo é deixar de ter sentido. e esta é a tarefa: andar para encontrar o término — ele, sim, permanente.
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Ansiava em subir numa paineira







No caminho do autoconhecimento, uma qualidade se torna essencial: a decisão. Ser decidido significa abandonar totalmente a hesitação e não se deixar influenciar pelas tentativas constantes da mente de nos fazer desistir da jornada.

E os argumentos serão muitos, desde aqueles que tentam nos fazer duvidar dos mestres, até os que buscam nos desviar para prazeres imediatos e supérfluos.

Se não estivermos firmemente focados no objetivo de mergulhar profundamente em nosso próprio interior, certamente nos deixaremos seduzir facilmente por estes chamados.
Afinal, seguir o desconhecido, sem nenhuma garantia acerca do que encontraremos no final, é um desafio que exige determinação e coragem.

O divino, este aspecto misterioso de nosso ser é, ao mesmo tempo, nossa natureza essencial. Por mais paradoxal que pareça, buscamos afinal o que já possuímos, devendo para isto deixar de lado o que não nos pertence.

O ego, -nosso falso eu-, é desde sempre um conhecido, com ele desenvolvemos intimidade e por essa razão, passamos a dar-lhe total crédito, mesmo quando ele nos faz acreditar em falsos paradigmas.

Somente a persistência e uma confiança absoluta no processo, pode nos levar finalmente a experimentar um novo patamar de consciência, onde as dúvidas vão aos poucos dando lugar a um novo estado de ser, onde o sentimento de que a existência é sempre perfeita, do modo como se apresenta, tornam-se naturais.

Osho, quero me tornar um sannyasin, mas fui ensinado desde minha infância a tomar cada passo com muito cuidado. E por causa disso, eu tenho estado hesitando longamente. O que devo fazer?

Osho:
Se você segue em hesitação, você vai perder tudo que é belo. Porque o bonito vem apenas em raros momentos. Se você não está pronto o suficiente para saltar para ele quando o momento estiver lá, você vai continuar perdendo.

Um homem que continuamente hesita continua perdendo - porque quando chega o momento, ele está hesitando. Quando o momento se foi, ele pode até mesmo decidir, mas agora a oportunidade não está mais lá. Então, ele tem que esperar pela oportunidade...

...A vida pertence a quem é corajoso. E eu não estou dizendo que não tenha cuidado - mas para mim, cuidado tem um significado totalmente diferente do que ele tem para você. Cuidado, para mim, significa alerta, consciência. Cuidado não significa esperteza, não significa cálculo.

...Eu não estou dizendo, 'Seja cego e faça qualquer coisa. "Mantenha os olhos abertos. Mas apenas mantendo os olhos abertos e sentado em silêncio e nunca assumindo um risco, você não está indo a lugar nenhum. Você vai simplesmente morrer ali.

Você não está vivendo, você está vegetando. Mexa-se! A vida é movimento, a vida é rio. Se o rio hesita, ele vai se tornar uma lagoa. E um lago é uma coisa morta... E, mais cedo ou mais tarde, a lagoa torna-se seca, a água irá evaporar-se.

O rio corre e chega ao oceano, entra no infinito. E o rio não tem nenhum mapa e nem guias, e não sabe realmente onde ele está indo... O oceano está muito longe - nem mesmo o barulho do mar pode ser ouvido.

Mas o rio vai, pouco a pouco se movendo, muda-se para o desconhecido, continua tateando para o desconhecido... e um dia chega ao oceano. Todos os rios chegam...

Se você quer chegar, seja como um rio. A pessoa tem que estar ciente do que é direito – mas cuidado em excesso pode ser um obstáculo. Ele não vai permitir que você tenha o desconhecido em sua vida. O conhecido nunca é suficiente - apenas o desconhecido satisfaz. Somente quando você se move para o desconhecido você é fresco e jovem.

...Mas se você está infeliz e miserável do jeito que é, então, seja um pouco corajoso. Dê alguns passos para além do limite em que viveu até agora. Felicidade acontece às pessoas que estão mais vivas. Às vezes, muito cálculo, como de uma mente de negócios, cria problemas desnecessários... Portanto, o seu cálculo pode prejudicar você e pode prejudicar os outros também... seja um pouco mais corajoso.

...Hesitação é um velho hábito. Por causa de sua hesitação, eu posso dizer que você deve ter perdido muitas oportunidades também na vida - porque a oportunidade vem, e ela se vai. Ela não espera, ela não se preocupa com você. Ela vem, e em um momento ela se foi. E ela está lá apenas por um momento - a janela se abre por um momento e, então, ela está fechada e pode permanecer fechada para sempre... nunca se sabe.

Assim, quando a janela estiver aberta, dê um salto - vá para o desconhecido. Você não vai perder nada, porque você não tem nada. Por que você está preocupado com perder alguma coisa? Por que você está hesitando? O que você tem a perder?

É como um homem nu que não vai tomar um banho no rio, porque ele tem medo -onde é que ele vai secar suas roupas? E ele não tem roupa, ele é um homem nu, mas ele não vai tomar o banho, porque então ele irá criar complexidades desnecessárias - onde é que ele vai secar suas roupas?
Veja o que você tem de ter medo de? O que você tem a perder?
Apenas suas misérias!
OSHO - Zen: O Caminho da Paradox

A CHUVA, O SOL, AS PESSOAS


ALESSANDRO MARTINS

A chuva cai e cai para todos. O sol brilha e é para todas as pessoas que ele brilha. Coisas simples essas. Verdades cotidianas. Banalidades.
E, se eu dissesse para este que agora passa por mim para que olhe, olhe para a chuva e para de onde ela vem, lá do céu, daquela nuvem, daquela massa compacta e cinza de vapor, ele riria. O banal é risível quando apresentado como algo formidável.
E, para esta senhora, se eu apresentasse estendendo o braço, em um gesto premeditadamente teatral, o astro que, agora, fura a esfera nublada com seus raios, certamente ela acharia que eu fiquei louco. Afinal, é apenas o sol. E o sol é o sol, oras bolas. Tem sido o sol há alguns milhões de anos e assim será por mais alguns.
A certos pedestres a chuva entristece e o sol alegra. Para a maioria. Para outros, o contrário. O sol deprime e a chuva anima. Uma minoria.
Assim somos no breve período em que mantemos nossos pés solidamente sobre o planeta. Certas reações são tão previsíveis que dão dó. Quando se chega a alguma conclusão a esse respeito e decide-se reagir diferente do que todos esperavam, algo acontece.
- Vou fazer isso, pois eles imaginam que eu faria aquilo – diz o mocinho do filme, aquele que eu queria ser quando crescesse.
O olhar pousa com mais calma sobre si mesmo, mas como faria um bovino a se contemplar refletido na água que beberá a seguir, esquece rapidamente das questões anteriores e tudo acontece nos conformes. A orquestra segue a partitura. E o bovino entretido com a água que agora sorve esquece dos dias que passaram e nem pensa nos que virão.
Mas falo da chuva e do sol e das pessoas que encontro na rua porque tenho sido tomado por uma ansiedade, um sentimento que não chega a ser ruim de todo, e não é, pois seu movimento inicial vem de algo bom. Como se, no primeiro lance do jogo de xadrez, o jogador pudesse prever o final.
Diversas vezes eu fui ao cinema e em quantas dessas vezes lamentei ter ido sozinho, pois o filme era muito bom. Saía com aquela sensação, com aquela vontade de que todos o vissem e como um fanático passava a recomendá-lo a quem quer que encontrasse.
Uns iriam vê-lo e não gostariam, outros nem se dariam ao trabalho e outros ainda veriam e sairiam do escuro felizes. Certas amores são uma questão de fé.
Por isso, passei a recomendar, em vez de a quem quer que encontrasse, apenas para aqueles de quem eu mais gostava. E, como um evangelista, levava as boas novas somente a esses. Certos amores são uma questão de egoísmo. É preciso se preservar.
Porém, acabei mudando de assunto.
Eu olho para a chuva, olho para o sol e, sobretudo, olho para as pessoas nas ruas. E tenho isso, essa ansiedade. Que se resume a uma frase.
Eu gostaria muito que cada uma delas encontrasse em alguém aquilo que eu encontrei em você.
E, se eu segurasse a cada uma delas pelos ombros e olhasse em seus olhos e afirmasse o quanto isso é verdadeiro, muitas iriam pensar:
- Mais um.
Não. Não sou mais um. Assim como essa chuva que cai agora não é apenas mais uma chuva e esse sol não é o mesmo sol de há um milhão de anos.
Certos amores são como o amigo invisível dos filmes, que só você vê e, assim que um estranho se aproxima, é como se ele não estivesse ali. E chega a ser uma agonia pois você sabe que ele está presente e o forasteiro parece não ver. Talvez nunca veja.
Certos amores são como hipóteses a nunca serem comprovadas.
Sou o mendigo com manto do rei. Tenho a vontade irrealizável do milagre de que cada um que encontro enxergue o que para mim é mais que um vislumbre. De uma experiência totalmente individual e quase egoísta, de repente, vejo-me a querer abarcar uma humanidade inteira, o sol e a chuva.
Nesse movimento que julgava impossível, nesse salto mortal de costas e de olhos fechados sobre os punhais, faço caber no restrito, o geral.
E percebo que sou, em realidade, o manto do rei que envolve o mendigo.
Pois sei que poucos no mundo têm a chance de viver o que vivo agora, no jogo da pessoa certa e da hora errada, da hora certa e da pessoa errada.
Agradeço cada segundo do que tive até esse instante e que venha a ter a partir dele, com anseios de que cada minuto se desdobre em mil. Seja o tempo um mero jogo de armar.
Neste exato momento, a chuva cai só em mim. O sol brilha só sobre a minha cabeça.

A pele enxerga melhor



Para Lisiane

Eu tenho uma inclinação por sardas e cabelos ruivos. Mulheres com sardas costumam não gostar, é curioso.

Quando criança, uma amiga colava fita crepe no rosto e puxava acreditando que as sardas sairiam junto. Ela não respeitava as sardas, confundia com espinhas. Ficava furiosa com Deus, que pintou seu corpo sem permissão. Coloriu seus braços enquanto dormia no ventre. Abominava a idéia de ser diferente, tantos sinais de nascença como o número de estrelas. Sofria com brincadeiras alusivas à ferrugem.

Tanto que não usava dedos ou palitos de fósforo para aprender a contar na escola, mas as sardas. Enchia a tez de cremes da mãe para sarar daquilo que era uma virtude. Agredia as pintas como uma catapora, uma doença, uma tristeza de guitarra. Encabulada com os apelidos que poderia receber. Se um menino a observava com admiração, já tomava como crítica e virava o pescoço para não se machucar. Fugia de si, como se o véu fosse a própria face. Era uma muçulmana de sua timidez.

Enquanto ela queria tirar as sardas, desejava tê-las. A pele enxerga melhor com sardas. São os óculos naturais da pele. Fogo que levemente doura. Brasa singela que acomete as árvores e o crepúsculo no outono. Pão casado com a madeira.

As sardas são uma procissão da boca. Não retiram beleza, mas acentuam. Fazem qualquer rosto voar como os cabelos, subir como um vestido. Não deixam nenhum rosto brincar sozinho. São marcas de lábios das folhas. Uma chuva de folhas. O cheiro de alfazema das folhas.

O ouvido torna-se mais próximo das sobrancelhas, mais próximo do nariz, mais próximo do queixo. É possível acompanhar toda a vizinhança dos telhados. As sardas são balas de goma, o açúcar das balas de goma. Elas fazem o corpo rir mesmo quando está indisposto. Uma mulher com sardas tem jeito de praça na lomba. Eu só subia a lomba da rua porque tinha uma praça no meio do caminho para brincar e recuperar o fôlego. A praça sempre foi a véspera de minha casa. As sardas são a véspera do sol.

Um rosto com sardas, pode reparar, é bem iluminado. Não pela luz que entra, pela luz que já estava lá.

Fabrício Carpinejar

Dos outros


by Alessandro Martins 

Comum é que acreditemos ter a coragem para realizar atitudes erradas, mesmo aquelas que pessoalmente julgamos erradas e que, na solidão do travesseiro reconsideramos erradas. E que, ao acordar, pesamos acima da xícara de café, e elas pesam erradas. E, por incapacidade de evitar a sua realização, dizemos que tivemos a coragem de realizá-las. E, ao nos percebermos cada vez mais atolados nas consequências dessas atitudes erradas, continuamos realizando-as e nos aprofundando em seu fazer. Por outro lado, quando nos é dada a chance de tomar a atitude correta, fugimos dessa possibilidade como se fosse a coisa natural a fazer. É o que se espera da mediocridade. O comum e o esperado de um homem ou uma mulher é a covardia, atualmente, talvez até antes de atualmente e depois de atualmente. E, em contraposição, qualquer coisa diferente da mediocridade, qualquer coisa acima dela, é coragem. Não inteligência, não força, não amor pela humanidade. E sim coragem.
Eu queria ter noventa anos, só pra saber que tudo o que machuca hoje , são bobagens!

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

É os últimos anos não foram fáceis...
E eu ainda sei que não estou em uma fase boa, sempre que volto a escrever é porque fiz bobagens...
As vezes a gente guarda coisas, ou elas se perde no fundo da bolsa junto com batons fora de moda, moedas, papéis de bala e por algum motivo a gente enfia a mão lá... e pronto!
Juro que estou morrendo de medo, o silêncio me incomoda tanto, me irrita tanto quando as pessoas são obedientes!
Ta on?
Sexta
07:55
não tava srsr
08:28
Ta de bobeira hj durante o dia?
10:45
Mais pro final da tarde, uma prima que mora no interior esta voltando da praia e vai dar uma passadinha aqui....
Sexta
18:19
agora jé estou liberada!
18:22
Bele, vou tomar um banho e to indo
18:22
obaaaaaaaaa
então eu também vou tomar banho heheh
18:23
ui, assim que eu gosto, bem limpinha hehehe
18:37
ai ai ai não me atenta!
18:37
HUUUUUMMMMM
RSRSRS
Domingo
12:01
Você seria capaz de guardar um segredo, saber que isto mudaria muitas coisas na vida, mas o fato de não saber se isto é bom ou ruim e então permanecer como nada acontece, porque o que tem esta bom?
12:20
Claro! Mas pq, vc quer me contar este segredo? Posso ajudar?
12:42
Não sei porque quero contar... vontade de saber como é a vida sem o meu controle??? Eu tenho medo de mudanças... gosto de mudanças, mas só das que são promovidas por mim, e eu ainda não sei se quero mudar... eu gosto de algumas coisas que são pra sempre, diante de algumas coisas eu consigo me manter passiva, saber e não mudar em nada... tudo igual, queria saber se vc também é assim... não mudar e deixar o tempo correr...
13:04
Sou exatamente igual rsrs... coisas de aquariano
é algo em relação a tua família?
13:53
não... não é com minha família... deixe estar....
Let it be .....
14:03
i carai... Vc instiga e depois deixa quieto? agora fiquei curioso
14:07
é eu sei... me desculpe... pra algumas coisas eu sou covarde rsrsr
14:48
vem k, você vai viajar por 3 meses é isto?
14:48
Sim, pq?
15:33
efeito borboleta
15:34
Eu preciso dizer que te amo... Cazuza & Bebel

15:56
??????? Isto muito me preocupa!
15:59
vai viajar... não são coisas de sexta....
Domingo
23:58
Ainda nāo entndi!
Segunda
06:34
Não se preocupe... quando eu disse: "não são coisas de sexta"... é porque isto se arrasta a anos...
Hoje
06:40
Booom dia!!!! Já passou a preocupação?
- e fim de papo.... odeio quando faço merda! Noites sem dormir....